Mauricio Figueiredo

Educação, recursos humanos e o melhor do et cetera

segunda-feira, 18 de abril de 2016

Cusparada com valor de medalha





Qualquer moleque do século passado que brincava nas ruas do Rio, São Paulo, Salvador, Recife e de cidades do mundo afora e também no interior sabe que não há coisa mais ignominiosa para o ser humano do que cuspir em um outro.

A tradição oral que corre pelo mundo é que cuspir em alguém é algo mais grave do que dar-lhe uma bofetada, uma pedrada ou qualquer outro tipo de agressão.

Isso vale tanto para a tradição cristã como para o mundo não-cristão. Não se cospe em ninguém e Ponto.

No futebol, o craque corinthiano Neto, hoje comentarista de futebol, amarga o arrependimento de que em um dia, no calor da disputa ter cuspido no árbitro José Aparecido, com o qual anos mais tarde teve oportunidade de se encontrar pedir perdão e ser perdoado. Ele conta que esse episódio faz questão de contar para os próprios filhos, como um erro que cometeu e que não se deve ser cometido.

Chico Buarque de Holanda também traz em sua rica biografia, a mancha de em um entrevero de bar ter cuspido no escritor, humorista, entre outros títulos, Millor Fernandes.

A regra universal é a de quem cospe acaba sendo o grande perdedor, pela própria atitude covarde desse tipo de agressão. A cusparada é uma agressão feita à distância. Significa a falta de coragem para chegar próximo do agredido. E a gravidade é ainda maior quando a desavença ocorre no campo das ideias e das palavras.

Cuspir no rosto de alguém é menos do que desprezar uma pessoa. Pelo contrário, demonstra que ela te incomoda e você não consegue ser indiferente a ela. Parece que as mentiras que você diz que ouve dela, no fundo, em seu íntimo podem soar como um fundo de verdade. E a verdade sempre nos desarma.

A pretensa sujeira que atinge o rosto ou mesmo o corpo do próximo vem de dentro de nós mesmos. Ela parte do fundo do nosso coração e do nosso interior. Quando, se por ventura, cometemos esse ato abominável, o maior atingido somos nós.

Jesus, como sabem os cristãos e as pessoas informadas sobre o assunto, foi cuspido por um soldado romano. A reação não foi a de passar a mão no rosto e sim deixar a saliva escorrer juntamente com o seu suor e sangue.

Independente de crenças, pois o cristianismo está enraizado em toda a Cultura do mundo Ocidental, em especial, como reconheceram os quadros do Partido Comunista Italiano, por ocasião da queda do Muro de Berlim, e recomendaram a leitura da Bíblia como fonte para melhor conhecimento da sociedade humana, o Cristo utilizou sua saliva para curar pessoas. Com a proximidade de um cego (João 9:6) cuspiu no chão e com a lama formada passou nos olhos do doente.

A cusparada do deputado Jean Wyllys no desafeto Bolsonaro, além de um ato lamentável, acaba por render dividendos políticos para o adversário.

Conta-se sobre Histórias do Recife Velho, no fim do período colonial e com a Libertação dos Escravos, sobre a figura de um médico negro chamado Dornelas. Parte da elite recifense não aceitava a existência de um médico negro, ainda mais vestido como um branco e ousando usar cartola na cabeça.

Certo dia, doutor Dornelas ao caminhar por uma rua estreita de um bairro rico, depois de atender um cliente, viu do alto de uma sacada, uma iaiá se aproximar e disparar uma cusparada em sua cartola.

O médico sobre o olhar atônito dos populares, olhou o cuspe em sua cartola e disse: "pobre moça, está tuberculosa, tem pouco tempo de vida".

Alguns dias depois, um caixão sairia da residência luxuosa rumo ao lugar para que todos vão, com ou sem seus preconceitos e agressões.

É preciso cuidar que com uma cusparada, os grandes atingidos não sejamos nós mesmos.



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