Mauricio Figueiredo

Educação, recursos humanos e o melhor do et cetera

sexta-feira, 29 de julho de 2016

TJ do Rio

Projeto de Valorização da Primeira Infância nesta sexta-feira

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) vai lançar nesta sexta-feira, dia 29, o Projeto de Valorização da Primeira Infância. O objetivo é chamar atenção para os direitos e as necessidades das crianças, principalmente nos primeiros anos de vida, e estimular a criação de políticas públicas voltadas para o tema. A iniciativa será baseada em três eixos: priorização dos processos criminais que tramitam na Vara de Execuções Penais (VEP) e no Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Novo Degase) em relação às mulheres grávidas encarceradas, melhorias nos abrigos que recebem bebês e ações voltadas para a paternidade. O projeto vai integrar o plano estratégico do TJRJ e será incluído nas metas de atuação da administração do Judiciário fluminense, que vai destinar um orçamento fixo à iniciativa, possibilitando o desenvolvimento mais aprofundado de práticas relativas à questão.
O anúncio foi feito na quarta-feira, dia 27, pela juíza Raquel Chrispino, responsável pela Coordenadoria Judiciária de Articulação das Varas da Infância, Juventude e Idoso (CEVIJ) do TJRJ, durante a apresentação do Projeto Semana do Bebê, desenvolvido pela Unicef em todo o país com mulheres encarceradas com filhos na primeira infância, período que vai até os seis anos de vida da criança. “Essa questão da população carcerária é muito especial. Dentro do cárcere estão reunidas as amostras de todas as questões trabalhadas nos Direitos Humanos: racismo, violência, homofobia, criminalidade, miséria, machismo, entre outras. Espero que existam outros tribunais que tratem dessa questão da mesma maneira que o TJ do Rio está fazendo”, avaliou a magistrada.
O Projeto de Valorização da Primeira Infância pretende lançar um olhar mais direcionado e humanizado a pessoas que cometeram crimes ou estejam envolvidas em processos que tenham filhos, inserindo questionamentos pertinentes ao tema, como, por exemplo, quem seria responsável pela criança na ausência da mãe ou do pai. Essas informações seriam incluídas num histórico e ajudariam a embasar a decisão do juiz ao analisar o caso. A iniciativa segue os moldes do Marco Legal da Primeira Infância, sancionado pela Lei Nº13.257, de 8 de março de 2016, que alterou o Código de Processo Penal (CPP) e exigiu que presos sejam questionados sobre paternidade, com o objetivo de garantir o pleno direito das crianças.
A apresentação do Projeto Semana do Bebê foi feito pela pediatra e coordenadora da Unicef, Luciana Phebo, e pela psiquiatra Isabel Abelson. As especialistas explicaram que os primeiros seis anos da criança são fundamentais para o desenvolvimento da cognição e dos marcos psíquicos para o resto da vida, a chamada janela de oportunidades. 
“Valorizar a primeira infância é prioridade para a Unicef. Se você quer apostar no desenvolvimento do país aposte na primeira infância. Realizamos esse trabalho da Semana do Bebê em outubro do ano passado no Presídio Talavera Bruce. Nós constatamos que, das 28 mulheres grávidas, 25 ainda cumpriam prisão provisória. Já das 18 mulheres com filhos já nascidos, 11 ainda estavam nessa situação, sem a sentença definitiva, e viviam com o bebê no presídio. As mulheres presas permanecem com o bebê até o sexto mês de vida, que é o tempo mínimo de aleitamento materno. Depois, são retirados do ambiente carcerário, causando um desligamento e uma ruptura do vínculo com a mãe. Ou seja, se houvesse uma priorização dos processos dessas mães, muitas dessas mulheres poderiam nem estar presas no momento do nascimento de seus bebês”, disse Luciana.
A coordenadora da Unicef ressaltou ainda o sofrimento vivido pelas mães encarceradas. “As mulheres presas são penalizadas três vezes: pelo delito que foi cometido, pela estigmatização da população carcerária, pois a mulher é esquecida por todos e até pela família; e pelo afastamento forçado dos filhos. A prisão da mulher muitas vezes desestrutura toda a família porque elas geralmente são os chefes da casa. Essas crianças que nascem na prisão têm os mesmos direitos que as outras. Não é porque as mulheres estão nessa situação que os direitos das crianças devem ser violados”, destacou a pediatra.
Luciana Phebo também destacou o perfil das mães encarceradas. “São mulheres cada vez mais jovens, grávidas, envolvidas com o tráfico de drogas e preocupadas com o sustento da família e da casa. Esse problema das mães encarceradas tende a aumentar cada vez e temos de pensar alternativas e tratar o assunto com prioridade”, ponderou.
O Projeto Semana do Bebê nasceu da articulação e da mobilização de diversos órgãos públicos em prol do tema, incluindo o TJRJ. Numa abordagem inédita, a Unicef decidiu ouvir os relatos das detentas gestantes e estabeleceu melhorias nos eixos da saúde e da assistência social a essas mulheres. Em setembro, será realizada a primeira Semana do Bebê com adolescentes internados no Degase, em parceria com o TJ. “O desafio no Degase será ainda maior. A questão do afeto constrói ou destrói sujeitos. Um quarto dos adolescentes internos são pais de crianças na primeira infância, e na maioria das vezes essas crianças não tem registro civil de nascimento”, explicou Isabel Abelson.
A juíza Raquel Chrispino comparou o sistema prisional comum ao universo das medidas socioeducativas. “O Degase tem 15 meninas internadas com filhos na primeira infância. Já no sistema penal adulto esse número gira em torno de 20 mulheres já com bebês de colo e cerca de 40 grávidas”, disse. 
A presidente da Comissão da Criança, do Adolescente e do Idoso da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), deputada estadual Tia Ju, também esteve presente ao debate. “Eu acho muito importante ouvir a realidade dos fatos diretamente de quem conviveu com as crianças e suas mães encarceradas. Essa questão de restringir para seis meses a idade que a criança pode ficar no presídio junto da mãe foi um avanço porque antes víamos crianças de até sete anos convivendo nesse ambiente hostil e sendo tratadas como presas, mas precisamos ficar atentos. Nós, legisladores, temos que ter cuidado com o que nós criamos, para não estimular atrocidades e retrocessos. Quero um projeto que, de fato, atenda às necessidades da população. Fico feliz de ver que o Tribunal do Rio está promovendo esse debate”, comemorou a parlamentar.

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