- A velha senhora, protegida pela espessa névoa do anonimato, mantinha acalorada discussão consigo mesma, enquanto caminhava pelo parque. Ao fundo, a natureza alardeava o final do dia, tingindo o céu com cinquenta tons de cinza. Como é efêmera a glória. Hoje você é. Amanhã, quem você foi? No Brasil, a memória é traidora. Os americanos, ainda hoje, ensinam Lincoln nas escolas. Claro, tem aquela baboseira de que ele não mentia nem quando era criança. Fui presidente, pombas! Tá certo, era um pouco criativa. E daí? Tinha problemas com a matemática. Quem não tem? Quem nunca estourou o cartão de crédito? Me deselegeram na marra. Fui jogada na lata do lixo da história. E ainda empurraram no meu saldo devedor, umas contas esquecidas. Ah, como eu queria esmagar os ovos daquele jaburu... Eu bem que tentei manter o fogo aceso, declarando minha inocência em reuniões aqui e acolá. Mas elam iam ficando cada vez mais vazias. Proclamei, enquanto tinha palanque, que a culpa era da meta da merda, digo, da merda da meta. E também daquele ministro que, perdendo a esportiva, disse que era para eu colocar qualquer número, já que eu não iria respeitar mesmo. O dolo é dele!
*Carlos Ney é jornalista é escritor
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