Juiz propõe maior controle do Estado
na investigação dos autos de resistência
O auto de resistência não pode ser utilizado como instrumento da impunidade. A conclusão é do juiz Fábio Uchôa, da 25ª Câmara Cível/Consumidor do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, no depoimento, prestado na quinta-feira, dia 19, à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) que investiga os chamados autos de resistência e o papel do Estado na segurança pública. Fábio Uchôa foi convidado a abordar a sua experiência acumulada em 10 anos na Defensoria Pública e 21 na magistratura, a maior parte na área criminal.
O magistrado encaminhou uma série de sugestões à CPI, com o objetivo de reforçar o controle do Estado nas operações policiais previamente programadas em comunidades do Rio. Na opinião dele, essas incursões deveriam ser acompanhadas por promotores do Ministério Público (MPRJ), baseados nas delegacias das áreas, e que se determinasse o afastamento imediato, das atividades externas e com o recolhimento das armas oficiais, os policiais envolvidos nos autos de resistência. Ele propôs ainda a realização de perícia técnica nos locais em que ocorrerem os confrontos entre policiais e bandidos. Além disso, cópias dos autos de resistência deveriam ser enviadas aos organismos oficiais de Direitos Humanos, à Defensoria Pública e à OAB para acompanhamento do resultado das investigações.
Fábio Uchôa destacou também, como medidas importantes, entre outras, a presença de médico e ambulância do Corpo de Bombeiros quando houver incursões. E ainda que os envolvidos em autos de resistência fiquem impedidos de serem indicados à promoção por merecimento ou bravura, ou receber condecorações honoríficas, durante o período em que perdurarem as investigações e até o arquivamento do inquérito pelo juiz. Manifestou a necessidade de se encaminhar cópias do auto de resistência ao Ministério Público Federal, quando houver inércia na apuração. A medida poderá deslocar a competência para a Justiça Federal, por representação do Procurador Geral da República.
O juiz e os deputados da CPI comentaram o elevado índice de homicídios no Brasil, que está entre os mais altos do mundo, e a falta de preparo da polícia para coibir a criminalidade. Na abertura da reunião, o magistrado providenciou a exibição de um vídeo sobre uma operação realizada pela Polícia Civil na Favela do Rola, em Santa Cruz. O vídeo foi feito por um dos participantes na incursão e mostra os policiais num helicóptero, atirando de fuzis contra pessoas que estavam em um bar da comunidade. O juiz apontou que, em nenhum momento, houve reação das vítimas à ação policial e o vídeo somente veio a público em razão de uma desavença entre os policiais envolvidos. Cinco pessoas foram mortas e os policiais alegaram que encontraram resistência. Só que a divulgação das imagens mudou o curso do processo.
O MPRJ pediu o arquivamento do processo, mesmo com a anexação do vídeo nos autos. Fábio Uchôa não acatou o pedido. O processo está em tramitação, com três policiais denunciados por homicídio e sete por fraude processual. Segundo o juiz, os pedidos de arquivamento de processos por auto de resistência ocorrem em 70% dos casos, em sua maioria por falta de condições técnicas para o procedimento da investigação ou por negligência da autoridade policial.
“O sistema investigatório é falho. Em 14 anos no Tribunal do Júri, determinei o arquivamento de milhares de inquéritos de homicídios, sem autoria. É necessário haver um esforço maior da polícia na apuração dos crimes”, disse Fábio Uchôa. Acrescentou ainda que o exame de necropsia nas vítimas deixa de relatar fatos importantes. O juiz também se declarou contra a mudança da nomenclatura de auto de resistência. Segundo ele, a denominação para este tipo de situação é perfeita.
A comissão da Alerj é composta pelos deputados Rogério Lisboa (presidente) Wanderson Nogueira, Marcelo Freixo, Flávio Bolsonaro, Waldeck Carneiro e Paulo Ramos.
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