Mauricio Figueiredo

Educação, recursos humanos e o melhor do et cetera

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Professores, desencanto e abandono

Carta do professor Pedro Quental que está abandonando a rede escolar do Estado do Rio:

" Professores, desencanto e abandono

Nesta semana estive lendo o artigo científico intitulado “Professores,desencanto com a profissão e abandono do magistério” de autoria das pesquisadoras Flavinês Rebolo Lapo e Belmira Oliveira Bueno, da USP. O Artigo retrata a assustadora realidade do abandono do magistério público no estado de São Paulo, bem como os motivos e conflitos que envolvem essadecisão.

Importante ler.Importante ler, pois no Estado do Rio a situação não é diferente,possivelmente até pior. Essa semana conto como mais um que decidiu abandonar a rede estadual de ensino do Rio de Janeiro. Hoje, considerados os descontos, um professor recebe líquido 540, 47 reais por mês. Deste valor ainda precisa ser descontado os gastos com passagem e alimentação. Sobra quanto? Uma bolsa de iniciação científica do CNPq para um estudante de graduação, hoje, é quase o mesmo valor. Mas não é apenas a questão salarial, são as condições de trabalho, assim como a ausência de espaços reflexivos e de real e efetiva participação do professor. Predomina por parte da Secretaria de Educação uma visão claramente administrativa e que enxerga a escola como uma empresa. Uma perspectiva demasiadamente burocrata, onde a discussão sobre educação passa longe, assim como a discussão sobre as condições de trabalho do professor. Basta constatar o artigo de nossa Secretária de educação publicado no “caderno opinião” do “Jornal O Globo” da última segunda-feira, dia 19 de outubro.

A Secretária inicia o texto afirmando que “grandes empresas têm investido na inovação de processos como forma de agregar valor a seus produtos. Na administração pública,essa lógica não pode ser diferente”. Desconsiderando o grande equívoco de transpor uma lógica estritamente empresarial para a esfera da gestão em educação, a Secretária esqueceu-se de comentar que grandes empresas remuneram muito bem seus funcionários. O que não é o caso na rede estadual de educação.Portando um discurso da inovação e modernização da gestão escolar a partir do uso das novas tecnologias, o artigo comunica que se trata de uma “revolução silenciosa” esta que está acontecendo no sistema educacional do Estado do Rio.

Só consigo compreender o sentido deste “silêncio” na constatação da ausência de debates, reflexões, diálogo e efetiva participação de professores, alunos e sociedade neste processo. Quando foi que nos convidaram para esta conversa? Este é o silêncio possível de ver e escutar: as vozes silenciadas de professores, alunos e sociedade. Por este motivo sim, a revolução empresarial que está sendo conduzida é realmente silenciosa.

A postura pedagógica de um professor-pesquisad or, atuante, curioso, investigativo, criativo, reflexivo e tantas outras qualidades que fundamentaram nossa formação e que garantiriam um ensino público de qualidade, são praticamente impedidas de serem realizadas. Eu, comomuitos já fizeram e estão fazendo, estou pedindo exoneração da rede estadual de ensino do Rio de Janeiro. E não são poucos. Todos jovens, recém formados, inteligentes, sagazes, altruístas, compromissados, sérios e dispostos com trabalho. Depois não entendemos porque as coisas estão como estão nessa cidade. Todos pagamos o preço. A questão é social, diz respeito a todos."

Pedro Quental

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