Mauricio Figueiredo

Educação, recursos humanos e o melhor do et cetera

sábado, 6 de novembro de 2010

Monteiro Lobato e o politicamente correto

                                                  
Gosto muito de citar um trecho do “Bom dia para os defuntos”, de Manoel Scorza, no qual uma pequena cidadezinha do interior peruano, campeã em corrupção e bandalheiras, de repente vê ocupar a sua Comarca um importante juiz. O magistrado em um passeio pela praça da cidade deixa cair do bolso uma reluzente moeda de prata. Ela passa a ser o símbolo da “honestidade” do lugarejo. Ninguém ousa apanhar para si a moeda. É feita vigília na madrugada para que ninguém se aposse da moeda. Há um clima de tensão no ar, para que a moeda não seja carregada por algum larápio esperto. Até que, em um certo dia, o juiz passeando pela praça, bate com os olhos na moeda. Ele se abaixa e a coloca no bolso. E Scorza completa dizendo que “a cidade suspira aliviada”.
 Esse tem sido também o problema mal resolvido do Brasil com o racismo. Parte da chamada elite brasileira nunca admitiu a existência de um país com elevado contingente de negros, só perdendo em número para a Nigéria. O “embranquecimento” da população brasileira chegou mesmo a ser política de Estado, com a abertura para a imigração sendo uma dessas estratégias. Ao colono europeu foi dada muita oportunidade, enquanto ao negro brasileiro apenas a carta de alforria da princesa Isabel e mais nada.
Mas vamos a Lobato. Trata-se do Pai da chamada Literatura Infantil brasileira. As Histórias do Sítio do Pica-pau Amarelo são um marco em nossa literatura e os livros do escritor fonte de ensinamentos preciosos tanto para crianças como também para os adultos que tiveram a oportunidade de lerem seus livros para os filhos.
No passado, houve tentativa de banimento de Lobato de nossas escolas sob a acusação de divulgar ideias “comunistas” para as crianças. O ridículo da acusação não colou.
Agora, em pleno século XXI, vem à tona nova carga contra o escritor, acusando-o de racismo em virtude de trechos do livro As Caçadas de Pedrinho, com referências politicamente incorretas ao personagem negro Tia Anastácia.
Um dos grandes problemas educacionais e culturais brasileiro tem sido a falta das pessoas ditas “letradas” não exercerem, plenamente, a capacidade da contextualização.
Nesse aspecto, para ficarmos no campo da Literatura apenas, qualquer obra precisa ser vista e analisada em relação ao seu contexto histórico, geográfico e social.
Se uma contextualização até mesmo a famosa Bíblia acaba sendo digna de ser levada à fogueira.
Como a cidade de Scorza, tentamos disfarçar o nosso racismo (o negro é maioria nas cadeias, na população de baixa renda, de baixa escolaridade, etc), procurando proteger a “valiosa moeda” da nossa hipocrisia.
Em boa hora, o ministro da Educação, Fernando Haddad, colocou um freio no disparate. Pelo andar da carruagem poderia acabar sobrado para o menino e a professora maluquinha do nosso atual Ziraldo.

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