Mauricio Figueiredo

Educação, recursos humanos e o melhor do et cetera

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Apropriação do Fundo Especial pelo Governo

Presidente do TJRJ alerta para sucateamento da Justiça 


O presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, alertou que o pacote do governo poderá acarretar o sucateamento da Justiça, com o consequente fechamento de fóruns, diante de uma apropriação pelo Estado do Rio de Janeiro do Fundo Especial do TJRJ. Ele afimrou que o Poder Judiciário não irá permitir que a crise financeira do Estado seja utilizada para justificar o desrespeito dos princípios da independência e da separação dos poderes, em prejuízo a milhares de pessoas que têm demandas na Justiça.

A declaração, enfática, que ocupou um relato de nove páginas, foi feita nesta segunda-feira, dia 7, na abertura da sessão do Órgão Especial em que 25 desembargadores do TJRJ são reunidos para o julgamento de ações em tramitação na alta esfera do Poder Judiciário. O presidente do tribunal acrescentou que o governador Luiz Fernando Pezão reeditou projetos de lei que já haviam sido questionados pelo Poder Judiciário, pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública e por entidades, quando da sua primeira discussão, face às inúmeras inconstitucionalidades. “Agora, novamente reedita algumas propostas que além de inconstitucionais, não salvam o Poder Executivo, mas quebram o Poder Judiciário. Um verdadeiro "abraço do afogado", uma solução que importa no naufrágio de todos, ainda que sua causa não tenha decorrido do Poder Judiciário” – acrescentou o desembargador.

Empréstimos para fechamento de contas

O presidente do TJRJ acentuou os empréstimos que o Poder Judiciário tem concedido ao Governo do Estado, mostrando-se sensível à crise, como ocorreu em 2014, quando emprestou a quantia de R$ 400 milhões. Segundo o desembargador, tal valor foi fundamental para que o governo fechasse as contas e permitiu que Luiz Fernando Pezão tomasse posse no governo do Rio de Janeiro, já que afastou as restrições da Lei de Responsabilidade Fiscal.  O empréstimo, que ainda não foi devolvido pelo Poder Executivo, atinge hoje, com a devida correção, a quantia de R$ 500 milhões (meio bilhão de reais), e causa evidente prejuízo ao Poder Judiciário.

“Ao solicitar o empréstimo, o governador do Estado estabeleceu as condições de pagamento e de correção dos valores. No entanto, não cumpriu os termos, por ele mesmo fixados” – disse o presidente do TJRJ.  O desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho destacou ainda as iniciativas tomadas pela administração do TJRJ, colaborando para a obtenção de recursos para o governo do Rio de Janeiro. Uma dessas ações envolve a liberação de depósitos judiciais. Segundo o desembargador, no início de 2015, o Tribunal de Justiça encaminhou para a Alerj projeto de Lei conjunto com o Poder Executivo para liberação de valores de depósitos judiciais, o que permitiu ao Poder Executivo lançar mão de mais de R$ 7 bilhões de reais de depósitos judiciais (aqui também vale a repetição: mais de R$ 7 bilhões de reais).  Isto totaliza mais de R$ 12 bilhões de reais, se computados os valores dos precatórios (repita-se: mais de 12 bilhões de reais).

Em contrapartida, o Poder Executivo se comprometeu, nas leis complementares estaduais que permitiram a utilização dos referidos recursos, a pagar ao Poder Judiciário os valores que antes eram honrados pelo Banco do Brasil e que constituem fonte essencial de recursos para o custeio do Poder Judiciário. No entanto, diante da ausência dos repasses previstos em leis, está em débito atualmente em cerca de R$ 100 milhões de reais e, caso continue descumprindo as leis complementares, este débito com o Poder Judiciário será de 130 milhões de reais (repito, 130 milhões de reais) nos próximos dias.

Dever de Casa e repasse do duodécimo

Embora o Governo do Estado tenha contado com esses recursos, a falta de iniciativa visando a redução de gastos foi critica pelo presidente do TJRJ. Assim, ciente da crise, da qual certamente também é parte, diante da continuidade de governos, o Poder Executivo deveria ter feito seu "dever de casa", após ter recebido tamanha verba, embora, infelizmente, não se tenha visto, neste período, esforço efetivo de redução de gastos. Ao contrário, houve manutenção de despesas expressivas com propaganda, isenções fiscais e nomeação de inúmeros cargos em comissão, como noticiado na mídia, e de gastos também elevados em obras olímpicas” – disse o desermbargador.

O presidente do TJRJ lembrou que, mesmo diante da grave crise financeira, o Poder Executivo não pode se apropriar do duodécimo (percentual para pagamento dos salários), deixando de repassar o valor às demais instituições do Poder do Estado, conforme previsto na Constituição Federal e garantido pelo Estado Democrático de Direito. 

“O artigo 168 da Constituição Federal determina o repasse do duodécimo para o Poder Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública até o dia 20 de cada mês e a Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece os limites de repasses de 49% para o Poder Executivo, de 6% para o Poder Judiciário, de 2% para o Ministério Público, e de 3% para o Poder Legislativo, incluindo o Tribunal de Contas” – disse o presidente. “Em outras palavras, o Poder Executivo tem a chave do cofre, mas, embora tenha direito à maior fatia, não é o dono de todo o valor que está dentro dele. Assim, não pode se apropriar de parcela que não lhe pertence, ainda que em um período de gravíssima crise financeira” – disse. Ele acrescentou ainda que “... os limites da LRF funcionam como teto. Ou seja, não podem os chefes dos Poderes e de outras Instituições gastar mais do que o percentual estabelecido, sob pena de responderem pessoalmente pelos gastos e de terem que se adequar aos limites, inclusive com a demissão de servidores”.

O desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho acrescentou que, durante muitos anos, quando não havia crise na arrecadação, o Poder Judiciário apenas requereu a transferência da importância correspondente à sua folha salarial, mesmo com direito aos seis por cento da receita do Estado. A diferença restante do valor repassado acaba sendo incorporado ao poder Executivo.  “Tivessem os duodécimos sidos integralmente repassados, certamente poderia o Poder Judiciário contribuir ainda mais para a gestão da crise, já que poderia lançar mão dos superávits financeiros que lhe pertenciam e que não lhe foram repassados” - acrescentou.

Fechamento de Fóruns

O presidente do TJRJ também alertou o perigo no interesse do Governo em lançar mão de recursos do Fundo Especial do Poder Judiciário, que é protegido pela Constituição Federal e é a garantia ao Princípio de Autonomia do Poder Judiciário. Os valores do referido Fundo Especial são destinados ao custeio do Poder Judiciário estadual, fator indispensável para a independência deste Poder. “Lembre-se que o Poder Judiciário tem hoje 81 Comarcas que cobrem todo o Estado do Rio de Janeiro. Imagine-se, por exemplo, o fechamento de Comarcas ou de varas em locais da importância que possuem Niterói, Nova Iguaçu, Duque de Caxias, Campos dos Goytacazes, dentre outras” – disse. Explicou ainda que a Constituição Federal e a Lei Estadual vedam a utilização de tais receitas para pagamento de pessoal.

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