Mauricio Figueiredo

Educação, recursos humanos e o melhor do et cetera

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Discursos presidenciais

"Na hora do voto, os políticos
devem mentir até para as suas mães"
 (Machiavel)


Conta-se, em tom de anedota, que um famoso político brasileiro, com o objetivo de contagiar a plateia, mencionou uma frase e atribuiu a autoria a uma grande personalidade mundial. Posteriormente, ao ser criticado pelo fato de que o personagem famoso jamais dissera tal coisa, não titubeou e declarou: "Se não disse, deveria ter dito".

Já em política, nos dias atuais, nada melhor do que a autenticidade. Saindo do óbvio, a presidente Dilma Rousseff, em discurso durante o Fórum Social Temático (FST) de Porto Alegre mencionou um trecho da canção "Grândola, Vila Morena" para caraterizar o novo modelo de desenvolvimento na América do Sul. Mencionar Portugal, tão ligado a nós em termos cultural, linguístico e afetivos foi um gesto inteligente, em um momento no qual a sociedade brasileira costuma estar tão excessivamente arraigada aos padrões culturais advindos dos Estados Unidos.

Ao citar uma passagem da canção "Grândola, Vila Morena", de Zeca Afonso, e o 25 de Abril em Portugal, quando defendeu um modelo de desenvolvimento mais "progressista" e "democrático", a presidente da República saiu da dicotomia estéril e improdutiva dos exemplos Estados Unidos-Cuba, em substituição à antiga União Soviética, esfacelada com a queda do Muro de Berlim, em 1989. "Na América do Sul, como diz aquela canção da Revolução dos Cravos, da Revolução Portuguesa, "O povo é quem mais ordena'", declarou em seu discurso.

De acordo com Dilma Rousseff, na maioria das nações latino-americanas está em curso um novo modelo de desenvolvimento, que oferece respostas mais efetivas aos desequilíbrios internacionais."Nossos países hoje não sacrificam mais sua soberania frente às pressões de potências, grupos financeiros ou agências de classificação de riscos". Ela considerou ainda que "grande parte do mundo desenvolvido" está a enfrentar a crise com "medidas fiscais regressivas", que provocam consequências sociais e ambientais "nefastas". Intuitivamente, Dilma Rousseff demonstrou que existe muita coisa entre o Céu e o Inferno, conforme destacava Shakespeare.

Mas por falar em Shakespeare, a grande mancada veio da França, quando François Hollande, candidato socialista às presidenciais, citou Shakespeare e o presidente Sarkozy citou Blaise Pascal.

Acontece que mesmo os adeptos socialistas de François Hollande, consideram-no um "casca grossa", em termos de formação cultural e ficaram abismados quando ele estufou o peito e disse: "Eles fracassaram porque não começaram pelo sonho", atribuindo o dito a Shakespeare.

A reação dos seguidores da candidatura Sarkozy foi imediata. Colocaram na boca do presidente-candidato, também pouco afeito as coisas culturais, a doce frase: "O homem tem tudo organizado para que ele esqueça que vai morrer", atribuindo-a a Pascal.

Como mentira tem perna curta, descobriu-se que a frase dita pelo socialista foi extraída do livro "The Vision of Elena Silves", mas o Shakespeare, não é o famoso do "Ser ou não ser: eis a questão", mas do jornalista da BBC Nicholas Shakespeare que escreveu a obra em 1989.

Quanto a declaração de Sarkozy, o jornal Libération, com base em especialistas, garante que ela não consta de qualquer obra de Pascal.

"Na hora do voto, os políticos devem mentir até para as suas mães", como disse Machiavel no "O Príncipe".

Se ele nunca disse isso, deveria ter dito.

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