AVENTAL TODO SUJO DE OVO
Minha mãe, com certeza, está entre as primeiras mulheres que
nos anos 40, em plena Segunda Guerra Mundial, ingressou no mercado de trabalho,
não como participante de algum movimento feministas, que não existia na
ocasião, mas levada pela necessidade de lutar pelo pão nosso de cada dia, pois,
minha avó viúva dificilmente teria condições de sustentar seus 11 filhos.
Eximia datilógrafa, o que corresponderia atualmente, a um
especialista da área de informática, ela tornou-se secretária do então
presidente da FNM (Fábrica Nacional de Motores), a popular Fê Nê Mê, Brigadeiro
Guedes Muniz. A ida toda manhã, do ônibus da companhia que a apanhava no
Sampaio, bairro da zona norte do Rio, rumo a Xerém, onde ficava a fábrica, por
vezes se constituía em um tormento, principalmente nos dias de temporais,
quando os raios caiam por todo o lado na estrada que conduzia o ônibus por
entre as imensas árvores. A FNM ficava na subida da Serra para Petrópolis. Não
podendo esconder seu imenso medo era alvo das gozações dos engenheiros e
técnicos, sendo ela a única mulher no veículo.
Meu pai era um dos assistentes do brigadeiro e sempre
retornava de Xerém de helicóptero. Mas, um belo dia batendo os olhos na
secretária (minha mãe), mudou o rumo da prosa e passou a voltar da fábrica
também de ônibus.
Quando meus pais se casaram ouve pressão de meus tios e da
família de minha mãe para que meu pai fizesse com que ela deixasse o emprego.
Na ocasião, não era comum mulher casada trabalhar fora, com exceção de
profissões como o magistério e enfermagem, entre poucas outras. Ter cedido as
pressões foi, segundo minha mãe, um de seus grandes arrependimentos, pois
acreditava que se seguisse carreira talvez tivesse melhores condições
financeiras, junto com meus pais, que passou a arcar praticamente sozinho com
as despesas da nova família. Minha mãe mesmo assim sempre conciliou os
trabalhos domésticos e a criação dos filhos com diversas outras atividades, com
o objetivo de aumentar a renda familiar.
Nos Dias das Mães para ela era intolerável quando na rádio
surgia Angela Maria entoando uma canção especial do dia, em que outras
exaltações dizia que se via a mãe surgindo com o avental todo sujo de ovo. Para
ela, tal imagem era degradante. “Onde já se viu uma mãe com avental todo sujo
de ovo, como se não tivesse algo mais nobre a apresentar”.
Quando queríamos irritá-la, eu e as minhas irmãs, com meu
pai puxando o coro, cantávamos no Dia das Mães os versos de que “Ela é a dona
de tudo. Ela é a rainha do lar. Ela vale mais para mim que o céu que a terra
que o mar...”. Porém, antes de chegarmos ao “avental todo sujo de ovo”, minha
mãe indignada botava todo mundo pra correr.
Obrigado mãe: baixinho eu canto “A Rainha do Lar” com a doce
impressão de que de repente você aparecerá colocando a casa em ordem.
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